Essa decisão do
Superior Tribunal de Justiça, que mantém a condenação por danos morais do
Deputado Federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) por ofensa à dignidade da também
Deputada Federal Maria do Rosário (PT-RS) serve como balizador à imunidade
parlamentar, quando estabelece que esta é uma “garantia constitucional, e não
privilégio pessoal”. Isso é verdadeiro. E não poderia ser diferente.
Não faz nenhum sentido
um parlamentar querer utilizar-se da imunidade que o cargo lhe assegura para
dizer que não estrupa uma colega porque esta não merece. Um disparate dessa
magnitude, convenhamos, não pode encontrar guarida no nosso ordenamento
jurídico. Sobre a decisão do Superior Tribunal de Justiça, vejamos a notícia
publicada no Site da Corte de Justiça:
“O deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) terá de indenizar por danos
morais a também deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) por ofensas à sua
dignidade. A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ),
ao rejeitar recurso do deputado e confirmar condenação que lhe foi imposta pela
Justiça do Distrito Federal.
Bolsonaro afirmou publicamente, em discurso proferido na Câmara do
Deputados, em vídeo postado em sua página pessoal no YouTube e em entrevista
concedida ao jornal Zero Hora, que não estupraria Maria do Rosário
pois ela não mereceria, ‘porque ela é muito ruim, porque ela é muito feia, não
faz meu gênero, jamais a estupraria. Eu não sou estuprador, mas, se fosse, não
iria estuprar, porque não merece’.
Em primeiro grau, a sentença condenou Bolsonaro a indenizar a deputada
em R$ 10 mil e a postar a decisão em sua página oficial no YouTube, sob pena de
multa diária. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) determinou a
publicação da retratação de Bolsonaro em jornal de grande circulação, em sua
página oficial no Facebook e em sua página no YouTube.
Em recurso ao STJ, Bolsonaro alegou que não poderia ser responsabilizado
por seu discurso, por estar coberto pela imunidade parlamentar, visto que a
fala foi proferida no plenário da Câmara do Deputados e que a entrevista foi
concedida dentro de seu gabinete parlamentar.
Inaplicável
A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, afirmou que a imunidade
parlamentar é uma ‘garantia constitucional, e não privilégio pessoal’. A
ministra explicou que a imunidade não é absoluta, pois conforme a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), a inviolabilidade dos
deputados federais e senadores por opiniões, palavras e votos, prevista no
artigo 53 da Constituição Federal, é inaplicável a crimes contra a honra
cometidos em situação que não guarda relação com o exercício do mandato.
De acordo com a ministra, a ofensa feita por Bolsonaro, segundo a qual
Maria do Rosário ‘não ‘mereceria’ ser vítima de estupro, em razão de seus dotes
físicos e intelectuais, não guarda nenhuma relação com o mandato legislativo do
recorrente”.
Para a ministra, considerando que a ofensa foi divulgada na imprensa e
na internet, o simples fato de o parlamentar estar no recinto da Câmara dos
Deputados ‘é elemento meramente acidental, que não atrai a aplicação da
imunidade’.
Segundo a relatora, ‘é óbvio’ que, para o desempenho de suas funções, os
parlamentares não precisam se manifestar sobre qual mulher ‘mereceria’ ou não
ser estuprada, nem emitir qualquer juízo de valor sobre atributos femininos,
sejam eles positivos ou negativos.
Violência à mulher
Nancy Andrighi considerou que a ofensa suportada por Maria do Rosário
toca em uma questão de extrema sensibilidade para a sociedade brasileira, que é
a violência contra a mulher.
‘Ao afirmar que a recorrida não ‘mereceria’ ser estuprada, atribui-se ao
crime a qualidade de prêmio, de benefício à vítima, em total arrepio do que
prevê o ordenamento jurídico em vigor’, disse a ministra. Ao mesmo tempo,
segundo ela, esse discurso machista reduz a mulher à situação de mero objeto,
que se submete à avaliação do ofensor sobre servir ou não à satisfação da
lascívia violenta.
Para a ministra, a frase ‘não merece ser estuprada’ constitui expressão ‘vil’,
que menospreza “de modo atroz a dignidade de qualquer mulher”, sendo patentes a
ofensa à dignidade de Maria do Rosário e a necessidade de reparação do dano,
conforme estabelecido pelo TJDF.”
A imunidade parlamentar reverte-se de um conjunto de garantias dadas aos
parlamentares, para que estes possam exercer as suas funções sem
violações ou abusos por parte do Poder Executivo e Judiciário.
Com as prerrogativas da
imunidade parlamentar, esses políticos dispõem de liberdade e independência para
o exercício das suas atividades sem o risco de serem processados judicialmente.
Como se vê, a imunidade parlamentar garante ao deputado ou senador a
independência para o exercício das atividades próprias do seu cargo, não podendo
extrapolá-las como se fossem detentores de uma imunidade absoluta.
Todas as normas de
proteção aos congressistas estão previstas no artigo 53 da Constituição Federal
Brasileira, que diz que “Os Deputados e Senadores são invioláveis,
civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”.
A lei ainda determina que
os Deputados e Senadores, durante o mandato, não podem ser presos, com exceção
de flagrante cometendo crime inafiançável. Neste caso, a decisão de prisão do
congressista fica a cargo da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, dependendo
da Casa a que o político pertença.
Além da imunidade parlamentar, a Constituição garante aos
parlamentares o foro privilegiado, matéria hoje
extremamente questionada, inclusive em debate no Supremo Tribunal Federal.
Neste mecanismo, o congressista só poderá ser investigado e preso após decisão
tomada diretamente pelo Supremo Tribunal Federal.
A imunidade parlamentar,
como se sabe, não é uma garantia do indivíduo, mas do cargo ocupado, por isso
que se trata de uma prerrogativa impossível de ser renunciada pelo parlamentar.
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