Essa decisão é muito relevante. Na ocasião da ocorrência
do evento danoso ainda não existia o Estatuto do Torcedor, mas o Relator do
caso, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, fundamentou seu entendimento no
Código de Defesa do Consumidor (CDC). Em
decisão unânime, a Turma manteve acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo
(TJSP) que condenou solidariamente as duas entidades a pagar pensão mensal
vitalícia, restituição de despesas médico-hospitalares e indenização por danos
morais no valor de 120 salários mínimos, tudo corrigido monetariamente.
Por outro lado, esse processo ilustra bem a demora do
Judiciário brasileiro para dar resposta a uma demanda. Só agora em 2015, o STJ
manifestou-se sobre uma ação que diz respeito a um evento danoso ocorrido em
1993, ou seja, mais de vinte anos depois. Imaginem a situação de uma pessoa que
foi vítima de um acidente, como é o caso, e que dependa de alguma maneira do
desfecho do processo para que possa viver com um pouco mais de dignidade,
já que teve a capacidade de trabalho comprometida com o ocorrido. Sobre o julgamento,
confiram a notícia encontrada no site do STJ:
“A Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a responsabilidade
solidária do São Paulo Futebol Clube e da Federação Paulista de Futebol pelos
danos que um torcedor sofreu ao cair de uma das rampas de acesso ao estádio do
Morumbi, em maio de 1993, quando compareceu a uma partida entre São Paulo e
Corinthians pelo Campeonato Paulista de Futebol.
O Estatuto do Torcedor ainda não estava em vigor quando o
fato aconteceu, mas o relator do caso, ministro Paulo de Tarso Sanseverino,
fundamentou seu entendimento no Código de Defesa do Consumidor (CDC). Em
decisão unânime, a Turma manteve acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo
(TJSP) que condenou solidariamente as duas entidades a pagar pensão mensal
vitalícia, restituição de despesas médico-hospitalares e indenização por danos
morais no valor de 120 salários mínimos, tudo corrigido monetariamente.
Na
queda, de cerca de quatro metros, o torcedor – que era pintor de paredes –
sofreu fratura de clavícula e ficou com a capacidade de trabalho comprometida.
Mais de 20 anos depois, o valor atualizado da condenação passa de R$ 1 milhão,
segundo advogados das partes demandadas.
Tumulto
De acordo
com os autos, durante o procedimento de revista na entrada, centenas de
corintianos irritados com a demora e a superlotação do local se envolveram em
confronto com a Polícia Militar, que, na tentativa de contê-los, fechou o
portão de acesso ao estádio e empurrou a multidão, provocando o rompimento da
barra de ferro lateral da rampa e a queda de vários torcedores.
Em ação de
indenização, o pintor alegou que a superlotação do evento e a falta de
instalações adequadas deram causa ao acidente. O juízo de primeiro grau
considerou o episódio uma fatalidade. Em apelação, o TJSP reformou a sentença e
condenou solidariamente os demandados com base no CDC.
O clube e a
federação recorreram ao STJ invocando a incidência da excludente de
responsabilidade prevista no inciso II do parágrafo 3º do artigo 14 do CDC –
fato exclusivo de terceiro. Sustentaram que a queda teria decorrido da soma de
fatores externos à sua atividade e que a infraestrutura de proteção atendia às
normas de segurança.
Responsabilidade
objetiva
Para o
ministro Sanseverino, a responsabilidade das entidades organizadoras, dos
clubes e de seus dirigentes pelos danos causados a torcedor que decorram de
falhas de segurança nos estádios, mesmo antes do Estatuto do Torcedor, é
objetiva e solidária em face da incidência dos artigos 7º, parágrafo único, e
14, parágrafo 1º, do CDC.
Segundo
o ministro, a responsabilização do fornecedor exige que os danos sofridos pelo
consumidor tenham sido causados por uma prestação defeituosa do serviço, que
não atenda à segurança legitimamente esperada (artigo 14, parágrafo 1º). No
caso dos autos, ressaltou, o serviço não correspondeu à ‘segurança
legitimamente esperada’ pelo consumidor, pois foi prestado sem o zelo
necessário.
‘O serviço
prestado pelos réus foi inequivocamente defeituoso, seja pela falta de
infraestrutura para atendimento de um público de mais de cem mil pessoas, com
rampas inadequadas a tal situação, seja pela superlotação, com a venda de
ingressos em volume superior ao espaço reservado à torcida rival, submetendo a
multidão de torcedores a uma situação de agressividade entre si e de confronto
com a Polícia Militar’, afirmou em seu voto.
Sanseverino
ressaltou que, diante da responsabilidade de ambos os réus na ocorrência do ato
ilícito (superlotação e falta de conservação da estrutura do guarda-corpo), não
pode ser reconhecido o fato de terceiro como causa exclusiva da produção do
evento danoso.
Estatuto
O ministro
destacou que, se ocorresse hoje, o caso teria fácil solução jurídica com base
no artigo 19 do Estatuto do Torcedor (Lei 10.671/03), criado justamente para
situações como essas.
O
artigo dispõe que a entidade organizadora da competição, o detentor do mando de
jogo e seus respectivos dirigentes respondem solidariamente, ‘independentemente
da existência de culpa’, pelos prejuízos causados a torcedor que decorram de
falhas de segurança.
‘Felizmente,
na época do ocorrido, já vigia o Código de Defesa do Consumidor, assegurando
proteção ao torcedor enquanto consumidor de serviços’, ressaltou o ministro.
Quanto ao
valor da indenização, Sanseverino disse que não foi impugnado nos recursos,
mas, mesmo que tivesse sido, sua revisão exigiria reexame das provas do
processo, o que é impedido pela Súmula 7 do STJ.”
Vale
a pena ficarmos atentos, uma vez que situações como essas podem ocorrer nos
estádios brasileiros com relativa freqüência. Para
o ministro Sanseverino, a responsabilidade das entidades organizadoras, dos
clubes e de seus dirigentes pelos danos causados a torcedor que decorram de
falhas de segurança nos estádios, mesmo antes do Estatuto do Torcedor, é
objetiva e solidária em face da incidência dos artigos 7º, parágrafo único, e
14, parágrafo 1º, do CDC.
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