A
renúncia a alimentos por parte de um dos cônjuges é um assunto que já deu ensejo a muitas divergências
doutrinárias e jurisprudenciais. Ao longo de muito tempo, alguns magistrados e
tribunais se respaldavam na Súmula 379 do STF. O STJ, por outro lado, há muito
tempo que já havia firmado o entendimento no sentido de que a renúncia a
alimento seria válida, não podendo a cláusula que a estipulou ser
invalidada num segundo momento. Confiram uma Decisão do TRF-2 que tomava por base
a Súmula 379 do STF:
Data de
publicação: 21/07/2010
Ementa: ADMINISTRATIVO
MILITAR PENSÃO
POR MORTE SÚMULA Nº 253 /TFR - EX-COMPANHEIRA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA EVIDENCIADA SÚMULAS 379 DO STF E 64 DO
EXTINTO TFR TERMO INICIAL DA PENSÃO. I A orientação jurisprudencial é firme no sentido de
que a dispensa de alimentos, por ocasião da separação judicial do casal, não
importa renúncia ao direito de postulá-los, podendo ser ulteriormente
pleiteados, verificados os pressupostos legais. Nesse sentido está posta a Súmula
nº 379 do Supremo Tribunal Federal, plenamente ajustável à situação da
ex-companheira, objeto dos autos, dispondo, semelhantemente, a Súmula nº
64 do extinto Tribunal Federal de Recursos que a mulher
que dispensou, no acordo de desquite, a prestação de alimentos, conserva, não
obstante, o direito decorrente do óbito do marido, desde que comprovada a
necessidade do benefício. II -
Antes mesmo da promulgação da Constituição Federal de 1988 e da citada Lei nº
6.880 /80, a jurisprudência do extinto Tribunal Federal de Recursos já havia
cristalizado entendimento, reconhecendo à companheira o direito de concorrer
com outros dependentes à pensão militar, sem observância da ordem de
preferência, nos termos de sua Súmula nº 253 . III - No caso, a carência
e a dependência econômica da autora em relação ao militar, falecido na condição
de desquitado e com o qual teve dois filhos, restaram evidenciadas pelos
depoimentos testemunhais, uníssonos ao registrar que a demandante não
trabalhava fora nem recebia qualquer tipo de benefício ou rendimento, cabendo
ao militar arcar com as despesas do apartamento em que moravam. IV - Conforme
farta orientação jurisprudencial, a prova material, complementada por prova
testemunhal idônea, autoriza o reconhecimento da união estável. Entendimento
mais recente, aliás, vem-se posicionando no sentido de ser desnecessária,
inclusive, a prova material, em casos como o dos presentes autos. V - O termo
inicial da pensão militar deferida à companheira é a data do requerimento
administrativo, conforme jurisprudência deste Tribunal (AC 2001.51.01.017350-1 Rel.: Desembargadora Federal Liliane Roriz DJU 18/10/2004 pg.
281). VI Apelação da filha do militar improvida e
parcialmente providas a apelação da União e a remessa necessária....
Por
ocasião dessa decisão, no entanto, na ótica da maioria dos magistrados e tribunais
a Súmula 379 do STF já estava superada pelas reiteradas decisões do STJ, por
isso que surpreende agora a decisão da Quarta Turma, da Relatoria do ministro Raul Araújo. O
STJ pensava assim. Confiram:
STJ, REsp 701.902
A cláusula de renúncia a alimentos, constante em acordo de separação devidamente homologado, é válida e eficaz, não permitindo ao ex-cônjuge que renunciou, a pretensão de ser pensionado ou voltar a pleitear o encargo. (REsp 701.902/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15.09.2005, DJ 03.10.2005 p. 249)
STJ, REsp 226.330
Não pode o ex-cônjuge pretender receber alimentos do outro, quando a tanto renunciara no divórcio devidamente homologado, por dispor de meios próprios para o seu sustento. (REsp 226.330/GO, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 05.12.2002, DJ 12.05.2003 p. 304).
Com
esse novo posicionamento do STJ é possível que alguns magistrados e tribunais
passem a segui-la. Confiram a notícia encontrada no STJ:
“A
escritura pública em que o casal renunciou à prestação de alimentos quando
ainda convivia em união estável não perdura em situação de necessidade de um
dos companheiros. A decisão é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça
(STJ) ao julgar recurso em que o ex-companheiro pediu que fosse liberado da
prestação de alimentos, por conta da consolidação de ato jurídico perfeito –
expresso na escritura de reconhecimento de união estável em que havia cláusula
de renúncia à assistência material mútua.
No caso,
a ex-companheira ajuizou ação de alimentos com a alegação de que viveu dez anos
em união estável e passou a sofrer de um câncer de pulmão, que lhe impôs
restrições financeiras. A renúncia à assistência material mútua foi assinada
nos primeiros tempos do relacionamento, quando ambos tinham capacidade
econômica considerável, e a doença da mulher surgiu enquanto o casal ainda
vivia junto.
O pedido,
em primeiro grau, foi julgado parcialmente procedente para condenar o
ex-companheiro a pagar pensão de R$ 3 mil até a alta médica. O Tribunal de
Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) confirmou a decisão ao fundamento de que, em
se tratando de prestação de alimentos, é indispensável a verificação do estado
de possibilidade-necessidade, conforme o disposto no parágrafo 1º do artigo
1.694 do Código Civil.
Alto
padrão
O STJ já
havia enfrentado matéria dessa natureza, só que em casos nos quais a renúncia
aos alimentos se deu ao término da relação conjugal. Para esses casos, está
firmado o entendimento de que, ‘após a homologação do divórcio, não pode o
ex-cônjuge pleitear alimentos se deles desistiu expressamente por ocasião do
acordo de separação consensual’ (Ag 1.044.922). A nova hipótese tratou da
dispensa de alimentos quando ainda existentes os laços conjugais.
O ex-companheiro
alegou no STJ que a mulher tem padrão de vida elevado e que sua doença não
seria motivo para a Justiça lhe impor a obrigação de prestar alimentos. Disse
que não teria condições de contribuir para o sustento da ex-parceira, pois é
portador de doenças degenerativas graves – mal de Parkinson e Alzheimer.
O artigo
2º, inciso II, da Lei
9.278/96 afirma que a prestação de assistência moral e
material recíproca é um direito e um dever dos conviventes. O artigo 1.699 do
Código Civil dispõe que, uma vez fixados os alimentos, se ‘sobrevier mudança na
situação financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o
interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução
ou majoração do encargo’.
Irrenunciável
Segundo o
relator, ministro Raul Araújo, o processo informa que a doença acarretou à
mulher redução considerável de sua capacidade de trabalho, comprometendo, ainda
que temporariamente, sua situação financeira. No momento da ruptura da
sociedade conjugal, a situação que antes lhe permitia renunciar aos alimentos
já não existia.
Tanto
esses fatos como a capacidade ex-companheiro foram reconhecidos pela Justiça
estadual mediante a análise das provas do processo e não podem ser revistos
pelo STJ, conforme assinalou o relator com base na Súmula 7 do tribunal.
O
ministro afirmou que a assistência material mútua constitui tanto um direito
como um dever para ambos, e que tal direito não é passível de renúncia durante
a relação conjugal, pois tem previsão expressa na lei.
‘Ante o
princípio da irrenunciabilidade dos alimentos, decorrente do dever de
mútua assistência expressamente previsto nos dispositivos legais, não se
pode ter como válida disposição que implique renúncia aos alimentos na
constância da união, pois esses, como dito, são irrenunciáveis’, declarou.
Nesse
contexto – considerou o relator –, apesar de ser válida e eficaz a renúncia
manifestada por ocasião de acordo de separação judicial ou de divórcio, ela não
pode ser admitida na constância do vínculo familiar, nos termos da
jurisprudência do STJ.
‘Portanto,
dissolvida a união estável, mostra-se perfeitamente possível a fixação de
alimentos transitórios, nos termos do fixado pelas instâncias ordinárias’,
afirmou Raul Araújo.”
O número
deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
Entendia o STJ que o art. 404 do
CC/1916 (art. 1.707 do CC/2002), que lastreia a Súm. n. 379-STF não se aplica à
situação em que a mulher renuncia aos alimentos, uma vez que a irrenunciabilidade
lá expressa está contida no capítulo que trata dos alimentos fundados no
parentesco. E como entre marido e mulher não há parentesco, o direito a
alimentos baseia-se na obrigação mútua de assistência prevista no art. 231,
III, do CC/1916 (art. 1.566, III, do CC/ 2002), a qual cessa com a separação ou
divórcio.
Logo,
segundo entendimento do STJ, a cláusula de renúncia a alimentos disposta no
acordo de separação ou divórcio era válida e eficaz, não autorizando o cônjuge
que renunciou a voltar a pleitear o encargo. Esse entendimento já era tido como
pacífico, em razão dos inúmeros precedentes, como por exemplos: REsp 17.719-BA,
DJ 16/3/1992; REsp 8.862-DF, DJ 22/6/1992; REsp 85.683-SP, DJ 16/9/1996; REsp
36.749-SP, DJ 18/10/1999, e REsp 226.330-GO, DJ 12/5/2003. REsp 701.902-SP,
Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/9/2005.
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