domingo, 19 de janeiro de 2014
MAIS UM GOLPE NO DINHEIRO DOS TRABALHADORES. OPERAÇÃO DE BVA AFETA MAIS DE 70 FUNDOS DE PENSÃO
A história quase sempre é a mesma. Quando um banco entra em processo de liquidação, junto com ele afunda uma grande soma de dinheiro dos trabalhadores que estão nos fundos de pensão. Se alguém lembra, fato idêntico aconteceu com o Banco Santos na ocasião que houve a intervenção do Banco Central, e com outros bancos, como o Pan-Americano. E isso é simples de entender. No caso do Banco Santos, pouco antes de quebrar, oferecia taxas atrativas para os seus investidores. E quem sabe, algumas outras coisas além. Ocorre que os administradores de fundo de pensão precisam entender que isso não é tudo. Como o dinheiro dos fundos de pensão pertencem aos trabalhadores, que dele dependem para a garantia do futuro, nunca podem
perder de vista a questão da segurança na hora de investi-lo. Infelizmente, em regra, os administradores de fundos de pensão são indicados pelos políticos, que não estão muito preocupados com o preparo dos seus afilhados para o bom desempenho da função. É lamentável que seja sempre assim. Eis a seguir matéria publicada hoje, 19.01.2014, no Jornal Folha de S. Paulo:
"Mais de 70 fundos de pensão de empresas estatais e de prefeituras de todo o país correm o risco de perder a maior parte dos R$ 2,7 bilhões que investiram na compra de papéis lastreados por empréstimos originados no Banco BVA, em processo de liquidação desde agosto.
O investimento dessas entidades nesse tipo de papel é o dobro do que era conhecido até agora, segundo levantamentos feitos depois que a instituição passou à tutela do Banco Central e aos quais a Folha teve acesso.
Entre os bancos pequenos e médios, o BVA foi um dos que mais atraiu os fundos de pensão. As entidades o ajudaram a ter um crescimento relâmpago. Em seis anos, seus ativos aumentaram 17 vezes: de R$ 430 milhões, em junho de 2006, para R$ 8 bilhões, em junho de 2012.
Para captar os recursos dos fundos de pensão, o banco vendia títulos lastreados nos empréstimos que concedia, conhecidos no mercado como direitos creditórios.
Funcionava assim: o banco financiava empresas e depois transformava a operação num título, que era vendido a investidores.
Quase metade desses papéis, R$ 1,3 bilhão, foi vendida diretamente aos fundos de pensão. Os maiores compradores foram a Petros (dos funcionários da Petrobras), o Postalis (Correios) e a Refer (Rede Ferroviária Federal).
O outro R$ 1,4 bilhão foi negociado com fundos de investimento ligados ao BVA e que tinham os fundos de pensão como cotistas.
Nesse grupo estavam não só as entidades ligadas às estatais, mas também os institutos de previdência de 59 municípios e dos governos estaduais de Tocantins e Roraima.
Nessa ciranda, aparecem cidades do porte de Campinas (SP), Manaus (AM) e Joinville (SC), e entidades de pequenos municípios como Serra (ES), Palhoça (SC) e Bom Jesus dos Perdões (SP).
PERDAS
Nas avaliações de técnicos que destrincharam as operações do BVA, uma parte significativa dos empréstimos que lastrearam os papéis vendidos no mercado foi concedida a empresas com pouca condição de honrar os pagamentos.
Várias não tinham crédito com os grandes bancos. Por isso, aceitavam pagar juros mais elevados no BVA.
Nesse tipo de investimento, quando o devedor não paga, a conta estoura na mão de quem comprou o título. Para se prevenir, os investidores costumam exigir que o banco honre o compromisso, uma 'trava de segurança' conhecida como coobrigação.
Nas operações do BVA, só 15% tinham esse tipo de garantia, segundo especialistas que avaliaram o banco.
'Estamos enfrentando um grande prejuízo, apesar de todas as regras que criamos após a quebra do banco Pan-Americano [2010] para proteger esses fundos', diz Leonardo Rolim, secretário de Políticas de Previdência Social do Ministério da Previdência.
No fim de 2013, o BC obrigou os fundos de investimento a lançar em balanço as perdas decorrentes dos atrasos de pagamento desses títulos. Rolim, da Previdência, espera que os fundos de investimento em que prefeituras e Estados aplicaram consigam recuperar pelo menos parte das aplicações.
Mas as chances não parecem grandes. No ano passado, o liquidante do BVA, Valder Carvalho, fez um leilão para tentar vender trinta operações de crédito do banco.
Seria um teste para avaliar as chances de recuperação da carteira. Como os interessados pediram descontos que passaram de 70%, o liquidante desistiu. Procurado, Carvalho não quis se pronunciar.
Profissionais que tiveram acesso aos empréstimos da instituição calculam que mais da metade da carteira esteja na categoria de 'difícil recebimento'.
OUTRO LADO:
Ivo Lodo, ex-presidente do BVA, não quis se manifestar. A reportagem também procurou as dez entidades de previdência com maior exposição aos papéis do banco (veja quadro nesta página).
Cinco delas (Postalis, Geap e os fundos de Tocantins, Manaus e Macaé) não responderam até a conclusão desta edição. Os representantes do Refer e do fundo de Roraima não foram localizados.
Por meio de sua assessoria, a Petros informou que não investiu diretamente no BVA. Seus recursos foram para fundos que tinham direitos creditórios 'emitidos por empresas de médio porte'.
A Faceb, dos funcionários da Companhia Energética de Brasília, confirmou ter aplicado em "títulos estruturados pelo BVA, oferecidos pelo próprio banco", e que uma parte está inadimplente.
Sergio Miers, gerente do Ipreville, da Prefeitura de Joinville (SC), disse acompanhar a situação com cautela."
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